"Ordem na casa". Partidos reagem a declarações da ministra da Justiça sobre PGR

por Inês Moreira Santos - RTP
RTP

A ministra da Justiça admitiu que quer um novo procurador-geral da República capaz de restabelecer a confiança e de "pôr ordem" no Ministério Público que, como lamentou, sofre de uma "certa descredibilização". Em reação a estas declarações, os líderes dos partidos com assento parlamentar acreditam que podem ser feitas mudanças pela Justiça. O Chega quer ouvir Rita Júdice no Parlamento, já o Bloco de Esquerda e o PAN pedem esclarecimentos a Lucília Gago.

"O ambiente de suspeita, o clima de desconfiança face ao Ministério Público só favorece quem é verdadeiramente corrupto", reagiu Pedro Nuno Santos, em reação às declarações da ministra da Justiça.

Segundo o secretário-geral do Partido Socialista, é por isso que é "tão importante termos um funcionamento saudável da nossa Justiça" para que "não se facilite a vida a quem se quer misturar com aqueles que são de facto honestos e vivem a vida política com seriedade".

"Isso implica que tenhamos um sistema de Justiça a funcionar bem, de forma saudável, com confiança", repetiu.

E, reforçando a opinião de Rita Júdice, acrescentou: "Isso pode justificar mudanças e desde logo mudanças legislativas".

Sobre as mesmas declarações da ministra da Justiça, numa entrevista à Rádio Observador, o Chega admitiu querer ouvir a governante.

“[Ordem na casa] é uma expressão que não se coaduna com o sistema democrático em que vivemos, é uma expressão que não se coaduna com o sistema de separação de poderes em que vivemos, mas que tem um efeito ainda pior e mais nocivo, é uma expressão que talvez denote de forma involuntária as verdadeiras intenções do Governo e, infelizmente, do Partido Socialista em matéria de Justiça”, afirmou o líder do Chega em declarações aos jornalistas no parlamento.

Na mesma intervenção, André Ventura indicou que o seu partido vai propor a audição da ministra da Justiça na Assembleia da República, “com caráter de urgência”, para que a governante “dê explicações sobre as palavras que proferiu, sobre o seu intuito e os seus objetivos, e sobre aquilo que quis no fundo transparecer nesta matéria, numa matéria que sabe que é tão sensível para a República e para a democracia”.

O presidente do Chega acusou ainda Rita Alarcão Júdice de ter utilizado expressões “claramente antidemocráticas, claramente condicionadoras”, que “qualquer ditador do século XX usaria”, e que “violam o princípio da separação de poderes”, e concluiu que a governante quis dizer que o Governo vai “pôr o Ministério Público sob domínio, sob comando”.

“É uma expressão grave que para nós não pode passar em claro, reforça a importância que tem que ter a nomeação da próxima ou próximo procurador-geral da República, debate a que o Chega não se furtará, precisamente para evitar que seja nomeado alguém, como tivemos noutros tempos, que estava lá não para fazer o seu trabalho de investigação criminal isenta, independente, mas para fazer fretes ao poder político”, defendeu.

André Ventura disse também que “o Chega nunca se oporá a que ninguém seja ouvido no Parlamento”, e que não inviabiliza a audição da atual procuradora-geral da República desde que “não seja para ameaçar, para condicionar ou para questionar sobre processos concretos, porque seria uma violação flagrante da separação de poderes”.

Também em declarações aos jornalistas, a coordenadora do Bloco de Esquerda propôs que no “futuro se possa criar um momento” em que o próximo procurador-geral da República possa ser ouvido no Parlamento no início do seu mandato para explicar “a sua visão para a política de justiça e para a política criminal”.

Mariana Mortágua recordou o requerimento apresentado pelo Bloco para ouvir a atual procuradora, Lucília Gago, no Parlamento e criticou-a por, durante o seu mandato, não ter tido “um momento de comunicação e de transparência face às decisões do Ministério Público”, lembrando o “acumular de situações que têm a ver com fugas de informação” e “fugas ao segredo de justiça”.

"O que está em causa não é, em momento nenhum, a autonomia do Ministério Público"
, afirmou Mariana Mortágua, acrescentando que esta "deve ser sempre respeitada".

O que está em causa, segundo a líder parlamentar, é que "a procuradora atual possa explicar as decisões que foi tomando ao longo do seu mandato".O BE exige à PGR, continuou, "que tenha uma política de transparência e de comunicação e que possa explicar (...) as escolhas que tem vindo a fazer ao longo do seu mandato".

No mesmo sentido, Inês Sousa Real também reagiu exigindo "um perfil de transparência", criticando "esta bolha de silêncio em que a procuradora-geral da República se colocou perante sucessivas violações do segredo de Justiça".

Pelo PAN, a deputada defendeu que o nome do sucessor de Lucília Gago deve ser discutido na Assembleia da República num debate “que envolva toda a oposição” e “permita uma auscultação prévia para sabermos qual a visão que [cada candidato] tem para a justiça e para o Ministério Público”.

Inês Sousa Real abordou ainda as palavras da ministra da Justiça, mostrando compreensão com a “frustração” de Rita Alarcão Júdice relativamente à atuação do Ministério Público, mas sublinhou que esta “deverá ser sempre uma atuação livre de qualquer ingerência política”.

A ministra da Justiça reiterou, entretanto, que o próximo procurador-geral da República deve ter capacidade de comunicação, mas também contribuir para a “dignificação da Justiça”, para eliminar “ambiente de crispação” e exercer funções “em linha com a Constituição”.

Numa publicação na rede social X, Rita Alarcão Júdice reiterou afirmações feitas na entrevista ao Observador.


Rita Alarcão Júdice admitiu que há uma "certa descredibilização" do Ministério Público e quer que o próximo procurador-geral da República inicie “uma nova era” e “ponha ordem na casa”.

Em entrevista ao programa ‘Justiça Cega’, da Rádio Observador, a ministra garantiu que o Governo não tem dúvidas sobre o perfil para o novo procurador-geral, que terá de ser de liderança. Recusou-se a comentar o trabalho da atual procuradora-geral da República, Lucília Gago, que foi indicada por António Costa e nomeada por Marcelo Rebelo de Sousa, mas diz que o Governo quer iniciar “uma nova era”.
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